Esta comovente ode à vida através de uma improvável e perigosa experiência etílica correu o risco de não chegar às telas devido à morte trágica da filha do diretor, o dinamarquês Thomas Vinterberg.
Ao receber o prêmio, o cineasta, com lágrimas nos olhos, falou da filha, Ida, cuja perda em um acidente de carro no começo das filmagens quase acabou com o projeto. O filme foi dedicado a ela.
“Se alguém se atreve a acreditar que ela está aqui de alguma maneira, poderá vê-la aplaudindo e comemorando conosco”, disse Vinterberg, emocionado. “Acabamos fazendo este filme para ela, como um monumento para ela”.
A comédia dramática, que mergulha nos altos e baixos do culto dinamarquês à bebida, superou “Shaonian de ni” (Hong Kong), “Collective” (Romênia), “The Man Who Sold His Skin” (Tunísia) e “Quo Vadis, Aida?” (Bósnia).
A fita acompanha quatro amigos de infância, professores da mesma escola de ensino médio, que enfrentam a monotonia perto de Copenhague. Entre eles, Martin, um depressivo professor de história em plena crise dos 40, interpretado pelo astro dinamarquês Mads Mikkelsen.
O pequeno grupo decide, então, se inspirar em uma teoria atribuída ao psiquiatra norueguês Finn Skårderud – mas desmentida pelo próprio – segundo a qual o ser humano nasce com um sutil déficit de álcool no sangue.
Eles resolvem beber para ficar permanentemente com uma alcoolemia de 0,5 g desde que acordam até a hora do jantar, e registram meticulosamente os efeitos do experimento.
Depois dos primeiros resultados animadores de uma embriaguez libertadora, a situação se degrada – embora o filme se negue a fazer julgamento moral ou a enaltecer o álcool – e se revela com frequência divertida.
“‘Druk – Mais uma rodada’ foi pensado como uma homenagem à vida, como uma reconquista da sabedoria irracional liberada de qualquer lógica ansiosa, que busca o desejo próprio de viver (…) com consequências às vezes trágicas”, resumiu Vinterberg na estreia do filme no ano passado.
Mas esta ode à vida está intimamente ligada a uma morte violenta e trágica: em 4 de maio de 2019, quatro dias após o começo das filmagens, o diretor, que ficou conhecido por “Festa de Família” (1998), perdeu sua filha, Ida, então, com 19 anos, em um acidente de trânsito sofrido com a mãe em uma estrada belga.
O carro onde elas estavam e que estava preso em um engarrafamento foi atingido na traseira por um motorista que usava o celular e depois bateu no caminhão que estava adiante.
As filmagens foram interrompidas, mas, embora devastado, Vinterberg decidiu terminar a produção, que dedicou a ela. Para ele, o projeto mudou de dimensão.
“O filme não devia mais falar só de beber. Devia falar de ser devolvido à vida”, explicou Vinterberg na única entrevista longa dedicada à morte da filha, em junho de 2020.
Selecionado para a edição de 2020 do Festival de Cannes, que acabou sendo cancelada, “Mais uma Rodada” já faturou vários prêmios, entre eles um Bafta de melhor filme em língua não inglesa e a um César – o Oscar do cinema francês – de melhor filme estrangeiro.
Sucesso em países onde pôde ser lançado em salas de exibição, o filme é conduzido pela atuação de Mikkelsen, que encontra Vinterberg depois de seu sucesso comum em “A Caça” (2012).
Fonte: AFP